quarta-feira, 11 de maio de 2016

Manoel de Barros: O Apanhador de Desperdícios

Começando o dia com poesia...
Em tempos duros, concretos...

O Apanhador de Desperdícios
 (do livro "Meu quintal é maior do que o mundo")

Uso a palavra para compor meus silêncios
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
Eu sou da invencionática.
Só uso as palavras para compor os meus silêncios.
Manoel de Barros

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